1998

Num domingo de sol, em novembro, no Ibirapuera, em São Paulo, eu fui ver a Orquestra de Glenn Miller, junto com 80 mil pessoas. 

Amo as Big Bands dos anos 1940.

Em plena apresentação, liguei para o maestro Oswaldo D’Amore, que estava em Natal, para que ele ouvisse a banda ao vivo. Ficou deliciado.

Depois, dancei um swing com o vendedor de picolés, com direito a todos aqueles passos e volteios.

Foi um dia maravilhoso.

 

1952

Quando eu era pequena, muito pequena mesmo, nas noites tranquilas de Campina Grande eu sentava junto de papai enquanto ele lia o Diário de Pernambuco e ia me ensinando as letras. Foi a primeira coisa que aprendi a ler, as primeiras palavras da minha vida que decifrei: Diário de Pernambuco. E, quase sem meus pais perceberem, aos três anos e pouco, eu lia tudo. Sei que não tinha quatro anos ainda porque quando fui para a escola de Dona Madalena, na mesma rua, seis ou sete casas acima da nossa, do mesmo lado, no início de 1952, aos quatro anos, eu já sabia ler qualquer coisa que pusessem na minha frente.

Mamãe fez para mim uma farda escolar, inspirada nas capas dos cadernos que eram comuns naquela época, e que se compunha de uma saia de pregas de tecido azul com suspensórios sobre uma blusa branca, de mangas curtas e gola em ponta. Nos pés, alpercatas escuras. Compraram-me uma pasta para a Cartilha, a tabuada, e o caderno, além do lápis com a borracha enfiada na ponta, e uma sacola de tecido onde levava o lanche que era sempre um pão francês ora com goiabada, ora com ovo frito. E assim ataviada e apetrechada, logo que Papai saía depois do almoço eu ia para a escola, deixando minha mãe em paz para que pudesse dar seu cochilo da tarde.

Morávamos então na rua Alexandrino Cavalcanti, os “Paus Grandes”, como era conhecido o logradouro nos tempos antigos. Hoje a rua se chama João Alves de Oliveira, e a gente morava quase no cruzamento com a rua João Leôncio. A casa foi demolida para alargamento do cruzamento.

A escola de Dona Madalena, situada no lado direito de quem desce, logo antes do cruzamento, era uma escola típica daquela época. Em torno de uma mesa comprida, colocada no terraço dos fundos da casa da mestra, agrupavam-se cerca de dez ou doze crianças de diferentes idades, às quais ela simultaneamente ensinava e tomava a lição, cada uma das crianças estudando um conteúdo diferente. Uma no quarto ano, estudando no livro de História do Brasil para ser argüida logo depois, outra resolvendo um problema de matemática do terceiro ano, e a professora fazendo um ditado para as pequenas do primeiro ano que estavam aprendendo a escrever, como era o meu caso, com uma pequena diferença: eu era a menor, só tinha quatro anos, enquanto as outras tinham seis ou sete. A varanda era agradável, cheia de plantas e aberta sobre o quintal, também com muitas plantas, uma lavanderia onde às vezes alguém lavava a roupa que era estendida em arames e ao fundo o chiqueiro onde os porcos enormes e enlameados roncavam e fuçavam a lama. Vez por outra, um dos animais se libertava e arremetia sobre a mesa de aula, provocando uma debandada geral dos alunos e a minha rápida subida para cima da mesa, pisando livros e cadernos, apavorada com medo dos porcos.

A professora era aí dos seus vinte e cinco anos, metida em vestido estampado de mangas três quartos, muito composta e espigada, volta de ouro no pescoço, brincos nas orelhas e óculos. Era paciente comigo, mas logo surgiu um problema que ela comunicou a Mamãe: A menina não sabe soletrar. Ela sabe ler, disse Mamãe. Sabe, disse a professora. Mas não sabe soletrar. Isso porque a cartilha, que era a de Tomaz Galhardo, tinha frases assim:

vo-vó viu a a-ve

a a-ve vi-ve e vô-a

eu vi a vi-ú-va

vi-va a vo-vó

vo-vô vê o o-vo

a a-ve vo-a-va

Então eu ia lá e, ignorando os tracinhos, que eu não sabia para que serviam, lia: Vovó viu a ave, a ave vive e voa, eu vi a viúva, viva a vovó, vovô vê o ovo, a ave voava. Parava, e olhava para a turma que, pasma, olhava para mim, sem entender porque eu não lia como todo mundo, soletrando: vê-ó-vó-vê-ó-vó, vovó, vê-i-u-viu, viu, a, a-vê-é-vé, ave. Então combinaram Mamãe e a professora que ela me ensinaria a escrever, ensinaria os números e deixaria eu ler do jeito que quisesse.

Na escola, então, eu logo li a cartilha inteira e como os livros dos outros alunos ficassem espalhados sobre a mesa e a professora não me prestasse muita atenção, eu pegava um ou outro e ia olhando as figuras e lendo trechos ao acaso. Logo aprendi a escrever, com uma letra muito regular e caprichada – que ainda tenho.

E assim vou me lembrando.

1992

Em 1992 Braulio foi fazer um show em Campina.

Durante a passagem de som eu subi ao palco e tirei essa foto ao lado dele. É tudo falso, e eu não estou cantando.  

A foto vale por um dos meus trajes preferidos: minissaia e colete e botinhas jeans.

Essa saia tinha 35 cm da cintura até a barra. Era um sucesso.

Ainda tenho as botas e o colete, no velho baú das roupas heróicas, dos trajes de guerra.

2002

Fui Curadora Literária e Cultural da Bienal Nacional do Livro de Natal nas versões 2002, 2003 e 2005.

Essa foto é provavelmente de 2002.

Com Cícero Oliveira (A.S.Livros), Enilson Santos (Editora da UFRN) e Abimael Silva (Sebo Vermelho).

Eram dez dias aí, entrevistando gente e lidando com os escritores.

Com o escritor Pedro Bandeira.
Com Paloma Amado, filha de Jorge, e Ana Maria Cascudo.
Com Danilo Guanais.
Com Leide Câmara.
Com o casal Vera e Diógenes da Cunha Lima.

 

1961

Braulio, com 11 anos; eu, com 14.

Num domingo, na granja do casal Odorico e Rosália, amigos dos meus pais.

 

1990

Eu e Alessandra Stewart.

Em 1990 eu morava na casa da Neuza Farache.

Numa noite de dezembro, convidei uns amigos para comemorar meu aniversário e preparei tudo para recebê-los no jardim da frente. Dezembro todo mundo sabe como é: festa em todo canto, e como meu aniversário é no dia 14, sempre há dificuldade de juntar gente nesta data ou perto dela. Principalmente nesse ano, pois a minha festa coincidia com o FESTNATAL/Festival de Cinema e o Carnatal. Ao convidar meu vizinho da frente, Mano Macário, nome artístico de Luiz Antonio Da Silva, ele disse logo que não podia vir, pois ia sair no bloco das Kengas, no Carnatal.

Mano era – e ainda é – um homem muito bonito. Nessa época, estava usando cerrada barba negra e me disse que ia tirar a barba para a caracterização que usaria no bloco, onde ia fazer “uma mocinha”. “Não seja por isso”, eu falei. “Quando sair do bloco, passe aqui, com o visual de mocinha mesmo, que eu terei prazer em lhe receber. Vou inventar para os convidados que estou esperando uma atriz do Festival de Cinema.”

E assim ficamos combinados, as horas passaram, chegou a noite e os convidados começaram a chegar. Eu anunciei que estava esperando a atriz Alessandra Stewart, amiga minha, que estava no elenco do filme “Faca de Dois Gumes”. Falei que tinha conhecido ela no Rio há tempos e que tínhamos ficado muito amigas.

O nome, obviamente, era inventado e não havia atriz com esse nome no elenco do filme. Uma das minhas amigas disse logo: “Ah, eu sei quem é.” E outra perguntou: “Não é aquela que trabalhou no filme Tal?” e eu: “É essa mesma.” E enfeitei a mentira: “Ela passou um tempo nos Estados Unidos e voltou só pra fazer esse filme.” A primeira amiga comentou: “Ela é linda! Muito boa atriz.” E a outra: “Não é ela que teve um caso com Reginaldo Farias?” E eu: “Essa mesma!” Essas minhas duas amigas são daquele tipo que sabem de tudo, viram todos os filmes, leram todos os livros e conhecem tudo – você entende, você deve conhecer gente assim.

E a festa foi correndo e eu alimentando o suspense: “Alessandra está demorando!” E as outras, ansiosas pra conhecer a celebridade: “Mas ela vem?” E eu: “Vem sim, ela prometeu.” E lá pras tantas chega no portão Mano Macário, com um minivestido preto de bolas brancas, peruca arrasadora, sem barba, maquiadíssimo, salto alto, uma verdadeira patricinha. Obviamente, via-se que era um homem vestido de mulher, mas irreconhecível até para os seus amigos, acostumados e a vê-lo com a frondosa barba preta. Quando eu o vi, saí aos gritos: “Alessandra Stewart, quanta honra! Entre, querida, pois quero apresentá-las às minhas amigas.”

E vou te contar: dinheiro nenhum paga a cara das duas quando viram a presepada. Foi lindo.

 Abaixo, outras fotos da mesma noite. Eu estava completando meus 43 anos de idade.

Ao meu lado, Maria Zélia. Atrás de mim, Ana Morena, preste a completar 12 anos.
Tetê Bezerra, Ademildo e Alessandra Stewart, que já tinha bebido todas.

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1994

Em 1994, a direção da TV Cabugi me convidou pra fazer um bloco que ia ao ar toda segunda feira no primeiro intervalo do RN-TV, escrito por mim. O título era Alto Astral, e o tema era esoterismo, astrologia, tarô, essas coisas, que estavam na moda.

Eu, muito sabida, fiz somente uns dois ou três programas sobre esoterismo e a partir daí comecei a falar de outras coisas: auto-estima, alegria, motivação, inteligência emocional, controle do stress, qualidade de vida e por aí vai. Esses temas depois eu desenvolvi em um livro chamado A Magia do Cotidiano: como melhorar sua qualidade de vida, que vendeu bem e me deixou feliz. Depois de três edições, está esgotado, mas é encontrado ainda nos sebos pela Internet afora.

O bloco na TV era dirigido pelo jornalista Sebastião Vicente, e era visto no Rio Grande do Norte inteiro.

Na foto eu, toda maquilada, esperando pra entrar em cena. Foram dez meses no ar.

1973

Já falei aqui na “Cama patente” que havia na minha moradia quando eu era estudante. Aí está ela, colocada por trás da estante que dividia o único cômodo da casa. Nesse dia, Assis que era metido a fotógrafo, fez um ensaio comigo. As fotos estão a seguir depois deste texto.

Esse vestido, com saia de tiras de diferentes estampados e blusa bordada de lantejoulas, era o meu vestido mais “elegante”. Com ele fui ao casamento de Braulio com Arly, em 1974.

1991

No jardim da casa de Capim Macio.  Esse jardim me deu muito trabalho a fazer. Comprei a casa recém construída, e o terreno era cheio de metralha, não se podia plantar nada. Eu mandei remover a metralha – o que deu um trabalho danado – e renovei o solo com areia barrada e húmus de minhoca. Aí devagar e lentamente as plantas começaram a crescer. Primeiro no jardim da frente. O jardim de trás, que você vê na última foto, foi outra história.

As fotos abaixo foram tiradas todas nesse mesmo dia.

Ana Morena, com a farda do CEI, aos 11 anos.

A entrada da casa.

Esse era o “jardim de trás”, como chamávamos o quintal. Ainda sem a grama. Comigo está Eliane, uma amiga gaúcha.